Palmas que o futuro chegou
Palmas que o futuro chegou

Palmas, que o furo chegou!

Gilson Leite de Moura

 

      O trânsito e os ruídos mudaram consideravelmente a vida até mesmo nas pequenas cidades em função do grande volume de carros e do mortífero número de motos pilotadas por pessoas inabilitadas. Tudo isso passou a acontecer num espaço de tempo tão pequeno que ainda não assimilamos esse “progresso”.

      As cidades não estavam preparadas e os prejuízos imediatos disso, logo apareceram no número crescente de vítimas, principalmente de jovens. Os incentivadores do consumo desses veículos só visaram o lucro imediato sem o cálculo das conseqüências como de costume acontece nesse país deslumbrado que resolveu crescer por crescer.

    O Estado, por sua vez, cegou para a realidade e só vê os impostos carreados para os seus cofres e não mais percebe que se tornou o responsável número um, pelas mortes, mutilações e pela baixa na qualidade de vida nas nossas cidades deslumbradas e até erradamente orgulhosas desse “progresso” que mata. 

      Eu diria que esse capitalismo selvagem não merece as vidas tão preciosas dos nossos jovens e dos cidadãos que morrem no trânsito. Dinheiro não compra vidas.

           O “altar” do capitalismo não merece a imolação e o sangue dos nossos filhos com tanta mutilação, com tanta dor e com tanto sofrimento. Estamos fazendo uma geração de mutilados que sofrerá até o fim de seus dias, as conseqüências desse desgoverno.

      Os governos são irresponsáveis quando permitem o uso dessas máquinas pelos jovens inabilitados que de intrépidos passarão a coitados ou então, ceifarão suas vidas antes dos dezoito anos. Afirmo sem medo de errar que essa irresponsabilidade só é permitida porque gera emprego e impostos. É assim que tem falado e agido nossos políticos. Este contracenso termina gerando muito desespero e a infelicidade para o usuário e seus familiares. As autoridades demonstram, nesse caso, desprezo pela vida, principalmente quando se sabe que um jovem acidentado teria muita vida pela frente e muita contribuição a sociedade, após seu amadurecimento futuro.

      Acho até que, como penalidade, as fábricas de motos deviam ser obrigadas a empregar na sua linha de produção, somente os que passaram a fazer parte desse exército de inválidos que sobraram vivos dessa macabra maratona. Por outro lado, a indústria de motos continua a ser incentivada pelo próprio Estado para alcançar uma grande produção, desde que gere para os governos, os impostos tão cobiçados. Mas o pior é que esses veículos em mãos erradas, quando não aleijam, matam e nos dá até o direito cidadão de chamar esse mesmo Estado de irresponsável.

         A indústria por sua vez, não mede os efeitos colaterais decorrentes do mau uso dos seus produtos, cada vez mais ruidosos e mais velozes. Até se orgulha da potencia mortífera dessas suas estrovengas de matar.

Para se ter uma noção real do que falo, basta visitar os hospitais por esse Brasil a fora. Será que compensa as vidas perdidas e o número crescente de mutilados?

        Até mesmo do ponto de vista econômico, se pudéssemos esquecer o valor de uma vida, será que o país não paga mais para tratar os inválidos que os valores arrecadados? Pelo que se observa o único beneficiário real desse negócio aparentemente tão lucrativo é o fabricante dessas máquinas de barulho.

       Será que compensa a dor ou será que a insensibilidade dos nossos políticos só vai despertar, um dia, quando acontecer com um dos seus?

     Quantos hospitais, nas capitais e no interior, se encontram hoje, abarrotados de jovens motoqueiros arrependidos. Esses mesmos jovens ocupam, por longo tempo, leitos de hospitais de emergência que seriam ocupados por pessoas que passaram a vida produzindo e movimentando, de maneira responsável a economia do país. Hoje com o corpo naturalmente desgastado pela idade, se obrigam a recorrer a um hospital frequentemente sem leito disponível porque os mesmos estão ocupados pelos acidentados do “progresso”. Para piorar a situação se constata que tais acidentes seriam perfeitamente evitáveis se as leis de trânsito fossem respeitadas e houvesse uma fiscalização rigorosa por parte do Estado quase sempre omisso nessas suas obrigações.                      

        Para que serve uma produção que mata? Será que o dinheiro está acima da preciosa vida de seres que nem viveram ainda?

       Será isso o tão famoso progresso, tão apregoado no passado dos nossos pais ou quando nos diziam que o Brasil é o país do futuro? Será que o futuro tão anunciado era esse e temos que bater palmas e dar boas vindas porque ele já chegou?

         Para que serve um progresso que aleija e mata na idade mais bonita do ser humano?

        Consumismo doentio e imbecilizante. Aliás, nem sei se existe o termo “imbecilizante”, mas estou querendo dizer que a propaganda massificante nos meios de comunicação tem feito muitos inocentes consumirem erradamente alguns produtos que destroem no curto e no longo prazo.  Dizem as tais propagandas que o mais importante é consumir e até já filosofaram dizendo que quem não consome não existe. Sei que isso só seria verdadeiro se o verbo consumir se referisse ao alimento sadio ou aos produtos que nos trouxessem conforto e segurança.

       Tudo está montado para o ouvinte imaturo concluir que se ele não possui aquela moto da moda, com as cilindradas necessárias para ele ganhar o “pega” ou fugir na hora da perseguição policial, ele é um ultrapassado e fora de moda.

           Os meios de comunicação bradam que é preciso consumir e conduzem com maestria aquele cidadão de cabeça oca, a pensar que isso é liberdade ou até um “direito democrático” quando na realidade é um tipo de escravidão camuflada, e que atua somente em benefício daqueles que lucram em cima de tamanha estupidez tão útil para eles.  

          Se o jovem gosta de aventura, não me consta que aventura é pular no precipício, fazer “cavalo de pau” ou se atirar loucamente no trânsito. Isso é burrice, não rima com jovem. E se o jovem também ficou doido, até para a sua segurança e a dos outros, temos que pedir sua prisão antes que se arrebente e se arrependa das loucuras irremediáveis que venha a praticar.

          Hospital é lugar de pessoas idosas, não de jovens, mas o fabricante de moto, o consumismo e esse capitalismo inconseqüente não estão nem preocupados. Aliás, quanto mais motos despedaçadas, mais o fabricante vai fabricar e mais o Estado vai arrecadar. Para quem escapou dessa guerra não declarada, a vida continua. Mas a vida continua até que uma dessas máquinas malucas suba a calçada lhe tire a vida, pois pelo andar da carruagem, isso não trará conseqüência nenhuma para o assassino. Ele vai jurar que é inocente e o advogado muito “competente” vai provar por A mais B que a culpa é da tranqüila e acolhedora calçada.

 

                                            Gilson Leite de Moura 03/12/2012